Reunimos pesquisadoras, educadoras, realizadoras e críticas de cinema para a realização desse dossiê, DESEJAR IMAGENS. O primeiro movimento, aqui, se deu na vontade de criar leituras acerca de filmes e outras obras audiovisuais realizadas por mulheres e pessoas dissidentes de gênero ou títulos os quais trazem o (não) protagonismo dessas/es sujeitas/es. A pulsão, o poder erótico e a recusa frente quadros, frames e imaginações, que o cinema e o audiovisual nos evocam, mobilizam estes escritos.

Convidamos a realizadora brasileira Manu Zilveti para a tradução do manifesto (Apuntes) hacia una critica feminista de cine, publicado em 2021 pela La Rabia. A troca com a revista latino-americana convoca olhares de desejo e desconfiança com as imagens, recusando leituras binárias e viris sobre o cinema. O conjunto de textos desse editorial reflete, confronta e mobiliza tangencialmente os enunciados desse documento, convocando ao riscos pelas/através das imagens. Arriscando pensar sobre o voyerismo exercido por mulheres no cinema, Barbara Bello escreve a partir de Variety (Bette Gordon, 1983), se distanciando das categorias de “female gaze” e “male gaze”, e reivindica o prazer em olhar.

A pesquisadora Nayla Guerra, em Você perdeu um curta-metragem didático excelente!, revisita uma crítica publicada na Zagaia em Revista em 2020, que se perdeu na nuvem da internet após o site ter saído do ar. Ao lançar uma leitura acerca de Folguedos no Firmamento (Regina Rheda, 1984), a pesquisadora dedica-se também a pensar sobre a invisibilização de mulheres realizadoras no campo cinematográfico brasileiro. O material está em estreito diálogo com Entre Apagamentos e Resistências (2024), livro recém lançado por ela.

Ausências e figurações da violência são temas do ensaio de Clara Prado, a partir de Los Órganos Internos de La Madre Tierra (Ana Bravo Perez, 2022), La Huella (Tatiana Fuentes Sadowski, 2012) e Todxs Queremos Un Lugar Al que Llamar Nuestro (Daniela Delgado Viterio, 2022). E a autora faz as seguintes perguntas: Como pode ser bonito olhar para imagens tão brutais? Como pode ser justo olhar e não ver nelas apenas a violência?

Para retomar as reflexões acerca da crítica cinematográfica, Lorenna Rocha apresenta o ensaio Por uma escrita fúngica, em que, a partir do livro O cogumelo do fim do mundo: possibilidade de vida sobre as ruínas do capitalismo (2022), propõe ferramentas de exercício da crítica através da ideia de “contaminação”: Seria possível incorporar em nossa prática de escrita crítica a natureza mutável, diversa e múltipla dos cogumelos matsutake?

Barbara Bello e Helena Elias escrevem em formato de conversa acerca do filme Todxs Queremos Un Lugar Al que Llamar Nuestro. O texto foi realizado durante a 6ª edição do Corpo Crítico, na última edição do Festival Internacional de Cinema de Belo Horizonte, uma construção de perspectivas críticas através do diálogo, em dupla, se desafiando com as provocações uma da outra, buscando o impossível esgotamento das imagens.

O som é o elemento investigado no ensaio de Helena Elias, mais precisamente, as imagens sonoras, a partir de As Mãos Negativas (Marguerite Duras, 1979), As Tais Cariátides (Agnès Varda, 1984) e Iré a Santiago (Sara Gómez, 1964). Ao ir de encontro ao trabalho de diretoras reconhecidas no circuito cinematográfico, a aposta de Elias é no cenário sônico que cada território presente nos curtas-metragens oferece. Já Quemuel Gomes escreve uma carta para Paula Gaitán, dedicando-se a sentir Noite (2014) e Rocha e Rio, Negro Leo (2019). A curadora Rita Vênus retoma sua paixão pelas obras audiovisuais inquietas e provocadoras de Tchesca Albernaz, publicadas nos stories e feed do Instagram.

Encerrando o dossiê, a artista e realizadora Barbara Marcel revisita o processo de feitura de seu curta-metragem Marlene (2022), abrindo incursões acerca do cinema do Terceiro Mundo, da Tricontinental, e formula questões considerando as tensões de gênero, raça e território ao filmar em Kinshasa, na República Democrática do Congo, sob influências, perguntas e contraposições em relação ao Leão de Sete Cabeças (1970), de Glauber Rocha.

dossiê #3: desejar imagens
por Lorenna Rocha