Abrir mão do controle, atravessar a imagem: uma conversa com Cristina Amaral | Dossiê #2 – Inventar coletividades, disputar o cinema: 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes

Transcrição: Lorenna Rocha e Renan Eduardo

Se deparar com a imensidão do trabalho de Cristina Amaral nos impulsionou a mergulhar em sua trajetória profissional e dedicar um olhar atento às suas contribuições artísticas no cinema brasileiro, não apenas como montadora, mas também para pensá-la como uma agente imprescindível para complexificarmos as discussões sobre o cinema negro no Brasil. Assim como na entrevista com Paula Gaitán, realizada durante a 26ª Mostra de Cinema de Tiradentes, esse é mais um dos esforços da câmarescura para desenvolver um material de introdução à montagem. 

Cristina Amaral participou como Júri Oficial do evento produzido pela Universo Produção e trouxe reflexões instigantes durante a mesa temática “Aquilombamento e práticas indígenas no audiovisual brasileiro“. Na entrevista realizada pela editora e crítica de cinema Lorenna Rocha, a montadora paulistana compartilha sobre seus percursos, referências e reflexões acerca do cinema brasileiro e comenta sobre os processos de montagem de filmes como Ôrí (Raquel Gerber, 1989), Abá (Cristina Amaral e Raquel Gerber, 1994), Serras da Desordem (Andrea Tonacci, 2006) e Mato Seco em Chamas (Joana Pimenta e Adirley Queirós, 2022).

Lorenna Rocha: O que é montagem para você?

Cristina Amaral: Enxergo a montagem como um espaço muito privilegiado no processo de realização cinematográfica, porque temos que lidar com todas as instâncias anteriores durante essa etapa. Puxo um fio lá de trás, desde o roteiro, vou além do meu próprio trabalho. É preciso acompanhar o que veio antes. Carlos Reichenbach (1945-2012), por exemplo, me mostrava versões diferentes do roteiro. Isso não gerava um engessamento do processo criativo, mas uma imersão na história e no sentimento daquele cineasta, no que ele está sentindo durante a construção do filme. Considero meu trabalho como finalizado após o primeiro visionamento da cópia final.

Quando Leon Cakof me apresentou ao Manoel de Oliveira (1908-2015), e disse que eu era montadora dele, Manoel me falou uma coisa muito séria: “A montagem é a terceira direção num filme”. Para ele, primeiro temos o roteiro, depois a filmagem no set e, por fim, a montagem. Na época, entendi isso como uma profunda responsabilidade, não como ego. A ideia aqui é de direção como caminho, enquanto rumo para o filme. A montagem é quando você bota a bola no chão e começa um jogo de novo, junto a todo o trabalho que veio anteriormente. É o instante em que você tem que olhar tudo com os olhos mais lavados possível, para poder enxergar e atravessar a imagem, até que chegue a um sentimento, a um significado.

Lorenna Rocha: Você sempre fala da influência de umas revistas de cinema, que lia ainda quando criança, como um primeiro contato com a linguagem cinematográfica. Em entrevistas, comenta sobre sua experiência com a publicidade, até enquanto um referencial daquilo que não desejava viver como forma de trabalho. Entre esses momentos da sua vida, há um marco que parece ser bem importante: a chegada à Universidade e o encontro com Paulo Emílio Salles Gomes (1916-1977). Poderia comentar sobre isso?

Cristina Amaral: Fui racionalizar todas essas coisas depois de um tempão trabalhando com cinema, revisitando as memórias, até chegar nessas revistas. Eu não tinha idade para ver os filmes da época, não os vi. Sabia os títulos, os nomes dos atores, fazia menção aos filmes estrangeiros com pronúncia correta, porque senão os meus irmãos mais velhos me corrigiam. Tudo isso fazia parte de um universo para mim. Me lembro da primeira vez que fui à uma sala de cinema… da sensação de estar lá, do calor, da criançada gritando. Mas não lembro qual era o filme. 

Só fui perceber a força do cinema em mim depois de um tempo. Em casa, assistia a muitos filmes, não me interessava por outros programas. Me lembro de assistir a filmes espanhóis e italianos à tarde na televisão. Os amigos da minha idade dizem que sou louca, porque eles não viram nada disso. [risos] Sou louca de outro jeito, mas é real! Aconteceu mesmo. Foi uma coisa muito presente até a minha adolescência, mas nunca havia pensado em fazer cinema, não tinha a menor ideia de como um filme era feito. 

Ganhei uma máquina fotográfica aos 15 anos, de presente de aniversário, e me tornei a fotógrafa oficial da família, então já havia essa relação com a fotografia. Quando estava terminando o colégio, nem sabia direito o que desejava fazer. Na época, o meu colégio promoveu uma semana de orientação vocacional, com testes e tudo, e o resultado apontou a área de Comunicações. Durante o período de decidir sobre a Universidade, busquei juntar as duas coisas e cheguei ao cinema. Era um curso básico de um ano e meio. Tínhamos aulas com a turma de Jornalismo, Artes Plásticas, Teatro, Música e Cinema. Foi nesse momento que encontrei um caminho em direção ao cinema, onde a figura do Paulo Emílio foi crucial. 

Sem desmerecer meus outros professores, mas eu poderia ter tido aulas só com ele que seria maravilhoso. Foi ele quem me deu esse norte, me fez entender o que significava fazer cinema no Brasil, a ter responsabilidade com aquilo que se coloca numa tela de cinema sobre o nosso país. Além disso, Paulo Emílio conseguiu com que a turma estabelecesse uma relação profunda com o cinema brasileiro. Estudávamos os primórdios do que foi realizado aqui e, ao mesmo tempo, éramos incentivados a assistir aos filmes que entravam em cartaz. Era uma época em que se faziam 120 filmes por ano. Nós assistíamos a todos eles, das produções da Embrafilme às pornochanchadas, e depois discutíamos em sala de aula.

Ele nos incentivava a ter uma relação visceral com o cinema. Dizia que não adiantava ficar viajando com Cahiers du Cinéma embaixo do braço, que era preciso olhar para o Brasil. Claro que nós assistíamos a outras cinematografias, queríamos saber de tudo, mas nossas alianças estão aqui. Paulo Emílio era um sol, um professor que fazia estarmos às oito horas da manhã completamente despertos, querendo estar na aula. Carrego comigo esse carinho, esse calor. 

Lorenna Rocha: Há algum filme que te marcou ou fez pensar que era aquele o tipo de cinema que você desejava construir?

Cristina Amaral: Um título não… São tantos! Mas houve alguns realizadores, sobretudo brasileiros, que me deram esse reconhecimento: Carlos Reichenbach (1945-2012), Andrea Tonacci (1946-2016), Rogério Sganzerla (1946-2004), Luiz Rosemberg Filho (1946-2019), Julio Bressane (1946-). Nós assistíamos aos filmes deles na sala de aula, porque não entravam em cartaz. Era o Paulo Emílio quem levava, pedia emprestado, era tudo em película. Às vezes, os realizadores iam conversar com a gente. E esses filmes… nossa! Sabe aquela onda grande que vem e te toma? Havia uma postura de rebeldia e desobediência que me marcou muito. Era exatamente a desconstrução do chamado “cinema bem feito”, europeu e hollywoodiano, aquele com direção de arte e não sei o quê. Esses diretores implodiram tudo e trouxeram vida ao cinema. Sentia a vida saltar pelas telas. Essa atitude me povoou.

Lorenna Rocha: Recentemente, assisti ao Jardim de Guerra (Neville D’Almeida, 1970) e tive exatamente a sensação que você trouxe. Está cada vez mais raro encontrarmos esse espírito rebelde no cinema, né? 

Cristina Amaral: O cinema está sendo muito formatado. Essa formatação chegou até no chamado cinema independente. Esses fundos de patrocínio e consultorias de roteiro dão impressão que os projetos são todos iguais. Isso torna mais difícil que os filmes mexam conosco ou tragam algum tipo de impacto. Tem um ou outro. Mas, via de regra, dá até uma preguiça. Adirley Queirós é um exemplo de como fazer. Eryk Rocha é outro. Percebi isso quando assisti ao Breve Miragem de Sol (Eryk Rocha, 2019), que tem uma lista de coprodutores gigantesca, Globo Filmes, produtora internacional, e ele conseguiu sair ileso dessa artilharia. André Novais também é de uma integridade impressionante. Eles têm muita personalidade, sabem o que querem fazer. Cumprem todos os protocolos dos editais, de coprodução, mas não abrem mão do que desejam. Muitas pessoas estão fazendo justamente o contrário: descaracterizando o próprio desejo para cumprir a um edital ou fundo de patrocínio.

Sempre lembro de uma experiência que tive em um festival de Santa Maria da Feira, em Portugal. No primeiro dia, vi um filme português que era “ok”: bem feito, uma história interessante. No entanto, havia alguma coisa nele que não entrava em mim, fiquei encanada com aquilo. Na semana seguinte, passou um outro filme, de um realizador brasileiro, e eu saí da sessão com o mesmo sentimento. Os dois filmes não tinham nada a ver um com o outro, mas sempre que pensava em um, me remetia imediatamente ao outro. Passei uns dias parafusando em cima desses títulos. Até que entendi que as estruturas narrativas dos dois eram idênticas, por isso eles provocavam sensações iguais em mim. Comecei a observar e isso é muito comum. São filmes que podem ser feitos em qualquer lugar, é só trocar o idioma. Isso nos faz perder a relação com nosso território, a responsabilidade com o lugar onde estamos fazendo nossos filmes.

Mato Seco em Chamas (2022)

Lorenna Rocha: Durante a mesa temática “Aquilombamento e práticas indígenas no audiovisual brasileiro”, você afirmou de maneira bem categórica que não existe uma indústria audiovisual no Brasil. Se pensarmos na sua geração, as relações de trabalho eram ainda mais turvas e precárias do que são hoje. Ao longo de todo esse tempo de profissão, como você percebe o processo de profissionalização e da tentativa de criar um cenário da indústria audiovisual brasileira?

Cristina Amaral:
  Não acho que as coisas estejam tão ligadas assim. O Brasil não fabrica um chip. Somos totalmente dependentes de tudo. Se resolverem parar de fabricar câmera, nós paramos. O cinema é a representação em imagem e movimento de um país. Não temos um Estado que entenda a importância que o cinema tem. Os Estados Unidos sabem muito bem disso, tanto que o cinema é o primeiro exército deles. A Índia, por exemplo, defende o seu cinema, não apenas no aspecto de produção, mas de exibição, que é por onde conseguimos formar público. Não sei se isso já mudou, mas, até um tempo atrás, filmes estrangeiros não entravam em cartaz nas salas comerciais indianas. Só em festivais, mostras e exibições especiais. Na Coreia do Sul, por determinação legislativa, 80% das salas devem exibir filmes sul-coreanos. Dessa forma é possível fortalecer as escolas e a formação profissional. 

O cinema dos Estados Unidos é sindicalizado, mas é algo muito hierarquizado, compartimentado, não tem necessariamente relações de amizade, tirando raras exceções. Que são aqueles realizadores que trabalham com a mesma equipe, com a própria família. Quando o filme acaba, cada um vai para um lado do país e não tem conversa. Quem conversa são os agentes, é uma outra relação. O que tentam trazer para o Brasil é essa parte ruim da indústria, essa relação resfriada e estratégica. Nós não temos infraestrutura. E ainda tem mais: Por quê os filmes lá tem bilheteria? Porque há um valor para o lançamento deles, que corresponde, ou até pode ser maior, ao que se gastou na produção do filme. Aqui, se não divulgamos, as pessoas não ficam nem sabendo do que estamos realizando. 

Se não temos o cinema como política estatal, vamos ficar nascendo e morrendo o tempo inteiro. Nós construímos uma resistência nesses anos de inferno [Governo Bolsonaro (2019-2022)] que passamos. Foi o cinema brasileiro que fez o papel de Ministro das Relações Exteriores, porque levou decência, qualidade, criatividade e talento para o mundo. Foram os filmes e nossos chefes indígenas. O resto era só vergonha. Não adianta ficarmos nos iludindo: nós temos um mercado exibidor que é desenhado para ser contra nós. O cinema brasileiro mais interessante sempre se fez com essa dificuldade, ele não é facilitado, mas é muito importante. Até mesmo o cinema americano reserva algum espaço para um cinema de criação. O Brasil precisa entender que aqui existe um cinema valioso, porque, no fundo, ele é sempre um ato de resistência. 

Deleuze fala que todo ato de criação é um ato de resistência. O cinema leva a potência dessa frase à sério. Temos que brigar para ter condições de filmar e ter um orçamento médio, de forma a possibilitar que mais longas e curtas sejam realizados. Às vezes, tem filme que possui um orçamento que devora meia dúzia de outros. Isso não é justo, sobretudo em fundos de financiamento público. Quanto mais filmes você fizer, mais você vai aprender e aperfeiçoar seu trabalho. Nós moramos num país com pessoas em situação de rua, morrendo de fome, passando por todas as dificuldades possíveis e ficamos falando de “indústria de cinema”. Dá licença! Nós temos que olhar com responsabilidade para o que temos, trabalhar e receber com dignidade. Querer aquela estrutura lá [dos Estados Unidos], não quero, não!

Você tinha comentado sobre minha trajetória e queria esclarecer uma coisa… Eu nunca trabalhei mesmo com publicidade. Quando saí da Universidade, não havia aprendido todos os recursos profissionais de finalização e de efeitos. Consegui um estágio em uma grande produtora, que fazia um filme por mês, com um grande orçamento. Era um bode ficar esperando esse filme chegar, porque era um universo estranho, não dava para conviver com aquilo. Para minha sorte, o montador de lá (Umberto Martins) era um cara que era apaixonado por cinema, formado no MAM/RJ. Só que tinha essa coisa da publicidade de começar a criar necessidades que a pessoa não tem, sabe? Tem que ter um sítio, depois tem que viajar para Trancoso toda festa de final de ano, jantar nos restaurantes mais caros de São Paulo, ou seja, cria um padrão de vida que não precisa ter. Se sair da publicidade para fazer um longa, simplesmente não volta mais… Assim, o cinema brasileiro perdeu vários profissionais.

Só para você ter ideia: nunca fui para a etapa de finalização, ficava só acompanhando o processo de montagem. Depois de um tempo, quando Umberto saiu da produtora, ele me chamou para ser assistente dele. Me pagava do próprio bolso, porque a figura de assistente de montagem não existia na publicidade. Fiquei fazendo esses trabalhos por quase um ano, muito por uma admiração por ele, porque, apesar das tranqueiras que chegavam lá, ele conseguia inventar um filme. Era um trampo que eu evidentemente precisava, mas sempre falava com ele que gostava mesmo de cinema. Em um certo momento, ele foi contratado por uma produtora e acabou convencendo-os a me contratar. Só que isso foi na mesma época em que a Raquel Gerber me chamou para fazer Ôrí. Não pensei duas vezes. Fui salva por Ôrí, para nunca mais.

Lorenna Rocha: Em uma entrevista com o Ugo Giorgetti, você comentou que Serras da Desordem havia sido um filme muito desafiador, pois exigiu lidar com uma cosmovisão desconhecida, trazida por aqueles povos indígenas. E chamou atenção sobre o tempo nesse processo. Me remeteu a uma conversa que fiz com Joana Pimenta e Adirley Queirós, em torno do Mato Seco em Chamas, filme que você também montou. Acho muito bonito quando a diretora fala sobre a importância de conferir certa circularidade temporal para a história. Seria possível traçar uma relação entre esses dois trabalhos?

Cristina Amaral: A primeira pessoa de origem indígena que conheci pessoalmente foi Carapiru [Awá Guajá] (?-2021), em Brasília, durante as filmagens do Serras da Desordem. Já havia assistido a uns filmes sobre a questão indígena, Andrea Tonacci (1944-2016) tinha uma convivência muito grande com eles, mas eu não. A questão é o ritmo, o tempo, esse outro olhar para o mundo. Uma coisa que me impactou muito no Karapiru, e também em outras pessoas indígenas que conheci, foi a doçura e delicadeza do olhar. Não é possível entender como alguém pode ter passado por tanta violência na vida e manter um coração puro daquele jeito. Fiquei muito impactada. 

Teve uma outra situação, de quando ficamos alguns dias com meninos de várias etnias indígenas, durante o Festival de Inverno de Diamantina. Eles nos faziam cantar e dançar em roda, todos os fins de tarde. Brincavam muito, apesar das histórias tenebrosas que atravessaram suas vidas. Um deles havia acabado de ver o pai ser assassinado em sua frente. Levaram o corpo e a única prova que o menino tinha era uma foto do sangue do pai no chão, que ele mesmo havia tirado com um celular. Esse rapaz ficava fazendo caldo de milho, que dizem que é para dar saúde e felicidade para as pessoas. Distribuía uma canequinha para cada um, todos os dias. Chega a ser quase incompreensível tanta bondade.

Se aproximar do tempo deles foi um processo. Eles têm uma relação muito particular, de entendimento com a terra, o ar, a água, o sol. É uma expansão dos sentidos. Costumo dizer que, nos filmes indígenas, os realizadores conseguem filmar o invisível. Eles possuem uma espiritualidade que é algo palpável, uma coisa concreta e muito particular. Foi um talento e uma sabedoria muito grande do Andrea ter concebido aquela sequência inicial. Ela nos faz sair do tempo da cidade, dessa agitação interna e nos obriga a entrar em outro tempo. Fui obrigada a entrar nele para poder montar essa sequência. Talvez ela seja a mais difícil de todas. Aqueles povos não viviam mais daquele jeito, mas o fato do Andrea colocá-los na mata, fazer com que eles tirassem aquelas roupas todas esfarrapadas que usavam no cotidiano, ajudou com que aos poucos eles recuperassem uma experiência atávica, que já estava neles. 

É por isso que falo que montagem é um exercício de olhar e escuta. Você tem que entender a vida que está saindo da tela em direção à você. É ir andando devagar, olhando, caminhando junto. Essa experiência foi um grande desafio para mim. Terminei Serras da Desordem e achava que precisava fazer mais alguma coisa. Era uma sensação que me inquietava. Hoje gosto dessa incompletude. Montagem precisa de tempo. Às vezes, recebo 120 ou 140 horas de material. É preciso se entregar a ele, ir junto, ver tudo, conviver com isso. Passei a perceber que estava caminhando com o Serras da Desordem quando os personagens deixaram de ser estranhos para mim, quando andava pela casa pensando neles como pessoas que eu conhecia. Carapiru já não era só imagens. Houve muito trabalho, mas tive que fazer uma travessia inicial. E o espectador também precisa fazê-la, senão ele vai se irritar, não vai entender. O espectador precisa se alterar internamente para ir junto com o filme. Precisei fazer essa alteração também.

Serras da Desordem (2006)

Em relação ao Mato Seco em Chamas, a questão do tempo foi se impondo de certa forma, porque o tempo de Sol Nascente, daquelas mulheres, da relação do Adirley e da Joana com todo aquele universo já veio impresso de outras temporalidades e nós passamos a entender tudo isso conforme vamos assistindo ao filme. Tinha monólogos, conversas enormes, que achávamos que precisavam ficar. Esses momentos deram um certo norte ao longa. Eram muitos materiais. Ainda preciso parar e medir quanto tempo tinha de material bruto, porque até agora não fizemos isso. Sempre faço essa contagem no início, até para calcular o meu tempo de trabalho. Mas, dessa vez, não fiz, não tive coragem.

A montagem do filme se deu durante a pandemia com muita conversa entre nós. Adirley na Ceilândia (Distrito Federal), Joana em Lisboa (Portugal) ou Nova York (Estados Unidos) e eu em São Paulo. Eles trabalharam muito, é uma montagem de seis mãos. Foram muitos diálogos até entendermos por onde nós iríamos. Tem coisas lindas e incríveis que ficaram de fora, sequências pré-montadas e acabam sendo retiradas. Temos que montar, porque isso compõe o corpo, a alma e o entorno dele. Foi uma coisa também de olhar, de entender como estávamos nos sentindo diante daquilo e quais rumos poderíamos tomar, o que nós desejávamos fazer.

Teve um momento que sentimos necessidade de percorrer as personagens. Foi muito importante. Nós queríamos construí-las individualmente. Como se primeiro o filme fosse sobre uma delas, depois só a outra. E era a partir disso que íamos decidir se entremeávamos as histórias ou produziríamos situações que se fechavam em si. Todas trouxeram muitas coisas, foi lindo entender aquelas mulheres. Elas têm essa vibe super violenta, porque a vida é violenta com elas, mas, ao mesmo tempo, elas brincam, são crianças e mães absolutamente amorosas. Solidárias, companheiras, mulheres que buscam viver seus próprios princípios. É muito impactante vê-las falando dos filhos, da família. Isso desmonta uma série de estereótipos. A figura da Léa (Léa Alves) tira tudo do esquadro. Tem momentos que ela fala feito o macho mais escroto possível e tem horas que fala do marido dela, do filho, com um amor tão feminino e bonito. É uma ruptura de paradigma.

Lorenna Rocha: São muitas nuances. 

Cristina Amaral: Sim. Esse foi nosso trabalho, perceber as nuances. Teve personagem que acabou saindo do filme, porque chegou um momento que estava ficando tudo muito complexo e grande. O grupo que permaneceu sintetizava muita coisa.

Lorenna Rocha: Recentemente, foi publicada na Multiplot! uma entrevista com a Raquel Gerber, realizada por Bernardo Oliveira, Ewerton Belico e Gustavo Maan. A diretora comentou sobre o seu trabalho em Ôrí (1989): “O papel dela foi muito importante porque ela foi uma espécie de curadora do material fílmico, entendeu? Quando eu lembrava de uma cena que podia encaixar bem naquele pensamento que estava sendo desenvolvido. A Cristina conhecia cada canto da película, ela sabia em que latinha estava. Ela tinha classificado muito bem o material porque a Cristina é taurina, entendeu? Então ela é pé no chão. Ela sabia tudo onde está. Eu já sou Aquário. Então, pra sonhar, imaginar, era comigo mesmo. Mas na hora de realizar, eu precisava de um montador inteligente e inspirado, como o Renato e a Cristina, que sabia tudo onde estava porque ela, ela era realmente uma curadora do material fílmico. Ela foi assim, incrível o trabalho dela e ela era incansável e única.” Gostaria de ouvir você sobre a montagem de Ôrí e essa relação curatorial que a Raquel traz para descrever o seu trabalho. 

Cristina Amaral: Ôrí foi uma vida da gente. Por conta dessa vivência, eu e Raquel somos muito amigas, irmãs, é tudo bastante entrelaçado. Antes de eu e o Renato Neiva entrarmos no projeto, uma pessoa havia começado a montar o filme. Inicialmente, fui chamada para ser assistente de montagem. Tive que reorganizar todo o material. Para montar o 16mm, nós tínhamos o copião com a imagem do filme e havia um magnético perfurado com o som, tudo do mesmo tamanho. Quando terminávamos o trabalho, as sobras de película poderiam ser usadas para cobrir as partes do magnético onde havia silêncio no filme. Encontrei imagens de Ôrí, que ainda não haviam sido montadas, usadas como silêncio. Foi um processo de recuperação, de abrir tudo, olhar, até nós termos todas as imagens do filme nas mãos e começar a montá-lo. Passei por todo o material, então conhecia tudo. Nós trabalhávamos juntos, mas teve um período que o Renato se afastou para fazer num filme do Wilson Barros (1948-1992) e assumi a montagem. Tem umas sequências do filme montadas por mim. Depois o Renato voltou e retomou o processo.

Foram três anos de montagem, achava que ninguém ia nos chamar mais para trabalhar. Nós nunca podíamos. Raquel valorizava muito a minha presença ali. Só que, às vezes, as pessoas ligavam procurando por mim para falar de algum trabalho e ela já chegava dizendo que não ia rolar, porque estávamos no meio de um projeto muito grande. E eu olhava e ficava pensando: “Não acredito! Ela recusou um trabalho para mim!” [risos] Acabei montando dois curtas escondido, à noite, sem falar nada, porque senão Raquel ia ficar preocupada que eu ficasse muito cansada. Mas, mentira tem perna curta, né? Os dois filmes foram premiados. [risos] Ela me perguntou quando eu havia montado e tentei desconversar. [risos] Trabalhos maiores, realmente, não tinha condição, era muita coisa e nós estávamos muito envolvidos. Foi tudo muito intenso.

A construção do filme era muito complexa. Foi lindo de se fazer, forte, com muita dedicação. Raquel ficou doente no meio do processo, eu quase ia ficando sem perceber. Estávamos no limite da energia. Tivemos que dar uma parada. Inclusive, foi a única vez que tive férias remuneradas no cinema. Paramos por um mês para nos recompor. O material era valioso, não íamos vender as sobras para fábrica de vassouras, não era o caso. Após terminarmos a montagem, tive o cuidado de organizar todas as imagens. Qualquer coisa que envolva o Ôrí, a Raquel me consulta, ela sempre tem esse cuidado. É uma aliança, decidimos juntas. Foi muito bonito! E ainda tem essa coisa linda dele ter me tirado da publicidade. Isso é impagável! [risos]

Lorenna Rocha: Estava pesquisando sobre Abá (1992), filme que você dirigiu com a Raquel. Inclusive, seu nome não estava creditado na plataforma de streaming em que assisti…

Cristina Amaral: Meu nome na direção desse filme é um carinho da Raquel. Fiz nele tudo que faço normalmente nos outros. As imagens de Abá são sobras do material de Ôrí. Ela me chamou para montar, fizemos juntas. Ela queria enviar um presente para o FESPACO (Festival Pan-Africano de Cinema e Televisão de Ouagadougou). Por mim, não me creditaria desse jeito, mas ela fez questão.

Lorenna Rocha: E como vocês chegaram na composição desse material?

Cristina Amaral: Abá é uma oração. Quem trabalhou os conceitos foi a Raquel. Fui fazendo de forma muito intuitiva, com as imagens e ela. Tem toda uma relação com a energia zigzag, fundante da cultura africana. Nós queríamos trabalhar com algo fora da racionalidade. Gosto muito desse filme. 

Lorenna Rocha: É lindo! E, infelizmente, bastante desconhecido. Não o vejo sendo exibido em mostras ou festivais dedicados aos cinemas negros, por exemplo. Inclusive, Abá dialoga bastante com as imagens que têm sido feitas contemporaneamente, que tem interessado realizadores e realizadoras negras brasileiras. Mas, você foi para o FESPACO com a Raquel?

Cristina Amaral: Não fui, mas fiz a ligação para que o Ôrí fosse exibido lá. Eu nunca havia ouvido falar nesse festival, mas ela conhecia, era alucinada para ir ao FESPACO. Raquel mandava correspondência para eles, mas ninguém respondia. Nós já estávamos com Ôrí praticamente finalizado, quando recebi um convite para ir à Alemanha, para participar de um seminário num festival. Contei para Raquel e me disse para falar aos organizadores do evento que eu não poderia ir, que estávamos terminando o filme. Olhava para ela e pensava: “Não acredito.” [risos] Se você conhecer a Raquel, vai ver que é muito carinho, ela achava que não conseguiria fazer sozinha, achava que eu tinha que estar junto naquele momento. Insisti dizendo que o filme estava todo preparado, que o Renato estaria com ela na mixagem. Tínhamos até uma segunda assistente, cuidando da preparação do material. No fim, ela aceitou, mas entendeu que eu ficaria fora só durante os 15 dias do festival. Era claro que eu iria! Imagina! Ganhei passagem na classe executiva, hotel cinco estrelas. Hoje não fazem mais isso. [risos] E olhe que era um festival pequeno, não era o de Berlim.

Conversei com o Ignácio [Gerber], marido dela e produtor do filme, dizendo que estava tudo certo e que ia passar um tempo lá, esticar a viagem para descansar. Só que eu não havia dito a ela que ia passar mais uns dias fora. Sabia que ela ficaria alucinada. Mas quando eu estava saindo da casa dela, uma amiga que estava lá e com quem o Ignácio havia comentado sobre a viagem, me viu e falou: “Nossa, que demais ficar dois meses na Europa!” [risos] Raquel ouviu e veio atrás de mim, me fazendo perguntas, né? [risos] E eu falei que ia para Europa abrir as portas para Ôrí

E você não vai acreditar no que aconteceu! Quando chego lá em Mana, havia dois representantes do FESPACO. Eles vieram conversar comigo. Assim que me falaram quem eram, comentei que estávamos tentando entrar em contato para enviar um filme ao festival. Um deles me deu um cartão e mandou escrever para o diretor do FESPACO. Falei que a Raquel era a diretora, que encaminharia o material. Expliquei tudo, indiquei com quem ela deveria falar. Mas, era impressionante, porque todas as correspondências de lá eram enviadas com o meu nome. O pessoal também é fogo, né? [risos] E eu dizia a Raquel: “Falei que ia abrir as portas do mundo para Ôrí, não foi?” [risos] Foi o primeiro festival em que o filme foi exibido. Ganhou o Prêmio da Diáspora de Melhor Filme e a partir de lá muitos outros convites chegaram. O filme circulou, foi exibido até no Japão. Eu precisava ter feito essa viagem para fazer essa ponte para o Ôrí.

Lorenna Rocha: Montadora e produtora, né?

Cristina Amaral: Sim! [risos] Foi muito legal. Lembro que fui no Festival de Berlim, conversei com eles. Por onde passava, levava informações do filme. Inicialmente, Ôrí teve um trajeto internacional muito bonito. Já aqui, nada acontecia. Não tivemos nenhum apoio da Embrafilmes, para nada. Ela fez esse filme por amor, pela importância que dá à questão do negro no Brasil. Já vi várias mesas com aquela discussão de que ninguém aguenta mais cineastas brancos falando de nossa história. Não podemos radicalizar. Se fizerem personagens estereotipados, temos que reclamar mesmo. Entretanto, não vamos deixar o Eduardo Coutinho fazer Santo Forte (1999) e Fio da Memória (1991)? Nem o Leon Hirszman fazer os vários filmes que ele fez? Nem a Raquel fazer Ôrí

Falei isso numa mesa e fui embora, porque sabia que vinha pedrada atrás. [risos] Um cara imediatamente pegou o microfone e falou: “Estou chocado de ver uma jovem negra defendendo cineastas brancos”. Isso tem a ver com o que você falou dos filmes não serem chamados para exibir. Ôrí está sendo requisitado agora, mas, na época, ele não foi selecionado para nenhum festival brasileiro. Sempre falava para Raquel: “Ôrí é um filme para o tempo”. E é o que aconteceu. Hoje, Ôrí está sendo entendido e respeitado, mas ainda tem muita gente que fica tentando cancelar a Raquel por conta dele. Acho um absurdo.

Frames de Ôrí (1989)

Lorenna Rocha: Voltando para o Abá, lembro dele ter sido exibido durante o 11º Festival Internacional de Curtas Metragens de São Paulo, no programa Dogma Feijoada – Mostra da Diversidade Negra, em contexto do manifesto Gênese do Cinema Negro Brasileiro, escrito por Jeferson De. Queria saber sobre sua participação no festival. Você lembra do evento? Naquele momento, qual era sua posição em relação à mobilização do Dogma Feijoada?

Cristina Amaral: Acho que sempre temos que escapar do risco de virarmos um nicho. Não gosto dessa ideia. Me lembro de uma discussão que participei no Aparelha Luzia (São Paulo), durante o Empoderadas, evento organizado por um coletivo encabeçado pela Renata Martins, onde jovens cineastas negras falavam muito de suas dores. Comentavam que não queriam continuar falando delas. E eu disse que as garotas, se quisessem, tinham o direito de fazer filmes sobre uma formiga, ou sobre uma flor que nasce no jardim de casa. Nessa mesma ocasião, comentei do próprio Aparelha Luiza, que é um lugar lindo, mas que tem que tomar cuidado para não ficar preso ali. É preciso ocupar a cidade. Há um acolhimento, reconhecimento, troca de belezas naquele espaço, que são muito importantes. Mas não se pode ficar nisso, se não você começa assumir os muros em volta de si. 

Essa coisa de nichos também é algo muito americanizado, né? “Cinema feminino”, “cinema negro”. É cinema, gente. Para mim, não adianta pegar uma bazuca e ficar disparando para todos os lados. É preciso entender quem está ao nosso lado e quem está contra nós. Se não, daqui a pouco vamos acabar atirando em quem nos apoia e andando junto de quem nos sabota. Sozinhos não fazemos nada. Há parcerias lindas no cinema. Foi isso que passei a entender, comecei a olhar para elas. Precisamos disso, é o que nos constrói. Não adianta ficar criando barra de ferro no meio do caminho, ficar no fundo carregando tanta dor. Todo mundo tem o direito de ficar mais leve, solto e feliz.

Não sei se me faço entender quando falo essas coisas. Sei que provoca alguns incômodos. Tanto no cinema negro, quanto em relação à questão das mulheres. Eu vim andando no cinema sem prestar atenção se sou homem, mulher, negra, ou o que seja. Isso não faz sentido para mim. Caminhei e é isso que temos que fazer. Nós já temos uma cinematografia feita por realizadores negros com consistência. É preciso inseri-la na história do cinema brasileiro. Quando começam a nos colocar em nicho, nós passamos a perder todo o resto do mundo. Nós deveríamos querer o mundo inteiro.

Na verdade, acho que temos que olhar por cima do muro, e ver o quanto é real, o quanto é vaidade e construção de espaço de poder. Se a discussão é franca, a base é outra. No Brasil, nós devemos dar atenção ao Ensino Básico. É lá onde mora o problema. É preciso dar acesso à educação e trabalhar a autoestima da infância e da juventude negra. É desse universo que estamos tratando. Nós precisamos olhar com mais sinceridade para a História.

Lorenna Rocha: Tenho me perguntado em que lugar fica o cinema feito por pessoas como você, Cristina, que está envolvida em processos de realização mais amplos, diferente do que tem sido circunscrito como “cinema negro brasileiro”. Você fala dessa coisa do diretor como caminho, mas tem sido particularmente desafiador entender o cinema brasileiro fora desses termos, sem dar tanta ênfase à direção cinematográfica. Muitas coisas tendem a aparecer nesse sentido, né? Grande Otelo, Luiza Maranhão, Cristina Amaral… Ôrí não me interessa só porque tem pessoas negras na tela, mas porque tem você manipulando um material fílmico, sabe?

Cristina Amaral: Muitas pessoas foram esquecidas no meio da caminho. É importante trazer à tona. O Brasil é um país negro e nos precisamos entendê-lo. Nós devemos nos posicionar dentro da história do cinema brasileiro. Quando falo de direção como caminho, não estou falando especificamente da figura do diretor, mas de todo o processo de realização de um filme e de todas as pessoas envolvidas no trabalho, sem hierarquização. É cada um colocando a sua parcela de compromisso e de energia: isto tudo compõe e transforma um filme.

Lorenna Rocha: Uma história complexa, né? Você comentou sobre o desejo de trazer todas as nuances possíveis da Léa, em Mato Seco em Chamas. Se eu pudesse materializar uma imagem para o cinema negro, queria que ela fosse que nem a Léa, complexa e imperfeita. Esse negócio de vermos uma mulher cantando um louvor enquanto segura uma arma nas mãos.

Cristina Amaral: É preciso se permitir, senão ficamos criando amarras para a realização dos filmes. Se me perguntarem qual é a minha inserção, direi que estou inserida no cinema brasileiro.

Lorenna Rocha: Fiz uma entrevista recentemente com a Paula Gaitán e comentei sobre um trecho de sua conversa com o Gabriel Araújo, para Mostra LONA, onde faz menção à influência do João Gilberto na sua prática de montagem. Queria compartilhar o comentário que ela fez sobre você: “Acho que ela tem uma escritura mais fina que a minha. Ela sabe aprofundar cada corte, dar o sentido. É mais straubiana. Cada corte tem um sentido muito profundo, ela é mais precisa. A questão da música, para mim, se organiza no momento da montagem. Já montei um episódio com a Cristina. Sinto que o processo dela é mais racional e poético. O meu é mais intuitivo, impreciso e associativo.” Você se acha racional e poética, Cristina Amaral?

Cristina Amaral: Não sei, não sei. [risos] Paula é uma pessoa muito generosa e modesta. Ela fala dessa coisa intuitiva, e não sei o quê, mas vem tantos saberes junto dessa intuição dela. Sei que a intuição também é uma forma de conhecimento, mas ela tem muito conhecimento teórico sobre cinema, artes plásticas, poesia. É um luxo o cinema dela, né? Você falou do João Gilberto (1931-2019) e me lembrei que esses dias estava ouvindo Miles Davis (1926-1991), que é outra pessoa que me inspira. Ele traz aqueles sopros que vão além do que a respiração aguenta. É algo que me tira o fôlego, fico alucinada ouvindo.

Não sei se sou tão racional. Se tenho domínio sobre o material. De vez em quando digo que os cortes se fazem e depois acabo levando uns sustos com eles. Sou levada pelas imagens e por tudo que vem junto enquanto estou na montagem do filme. Lido com muita energia, muita gente. Outro dia uma amiga me perguntou como é que eu me sentia ao estar sozinha na ilha de edição. E eu respondi: “E quem falou que estou sozinha? Vocês estão todos lá. Inclusive, tratem de deixar o set bem ameno, bonito, afetuoso, porque isso tudo vem junto com a imagem.” [risos] É muita coisa para lidar. Claro que há momentos mais racionais, de síntese. Mas, de resto, o filme é quem me leva e faço questão de me deixar levar, de não ter controle. De querer controlar a vida.

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